Por Carlos Eduardo Gonzales Barbosa
Os ensinamentos do Yoga estão abertos desde a sua origem. Nunca foram secretos. As Upanishadas que inauguram essa doutrina se expressam com clareza poética e a doutrina de Patanjali não oculta significados misteriosos. Mas o Yoga caiu no esquecimento por muitos séculos em razão do predomínio budista na Índia.
Quando o Yoga foi restaurado pelos natha-siddhas, ele foi cercado pelos segredos típicos do tantra, pois foi essa a cultura que resgatou o Yoga doutrinário para os hindus. São, no entanto, segredos relacionados aos códigos de prática tântricos e não interferem na compreensão da doutrina do Yoga.
O perigo de se disponibilizar a literatura tântrica do Yoga é ficar com o prejuízo moral ou físico decorrente da dificuldade de se compreender a linguagem utilizada. Como são poucos os interessados capacitados para ler o original em híndi ou em sânscrito, a maior parte dos leitores fica exposta às opiniões pessoais dos tradutores, nem sempre capazes, nem sempre bem-intencionados. Não há normas internacionais que orientem essas traduções, pois os códigos iniciáticos variam de família para família. Mesmo os comentários originais em sânscrito são questionados por estudiosos respeitáveis na Índia. Os comentários de Vyasa aos Sutras de Patanjali, por exemplo, contêm algumas gafes, embora este seja tido por muitos instrutores de Yoga como um texto canônico inquestionável.
Na tradição hindu, o sábio é chamado de poeta (kavi) e a visão privilegiada de um poeta é o que permite enxergar a sabedoria que um texto tântrico carrega em sua linguagem velada. O leitor racional tem toda a probabilidade de se afastar do sentido original do texto em favor de teses que seu intelecto aceite como mais plausíveis.
Por outro lado, a disponibilidade desses textos leva à liberação da obra para um esforço coletivo de tradução e compreensão. O Yoga é uma herança da Índia para a humanidade como um todo e jamais foi concebido como um privilégio para poucos. Ao sair do círculo fechado de iniciados que se arroga o privilégio exclusivo de traduzir um texto antigo, o ensinamento ali presente se afasta dos vícios de leitura que aquele grupo em particular possa estar conservando. Mentes abertas e corações atentos podem, coletivamente, levar as traduções ou comentários com uma fidelidade à inspiração do autor jamais obtida anteriormente.
Carlos Eduardo Gonzales Barbosa dá aulas de sânscrito e de culturas da Índia desde 1982. Desde 2004 tem foco no sânscrito falado. Dedica-se ao estudo da tradição do Yoga, em especial dentro da perspectiva dos nathas.
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