Yoga
Kundaliní, o Poder Serpentino, e os Chacras
Por Pedro Kupfer (para o site www.yoga.pro.br)
O Yoga vê o homem como um reflexo do macrocosmos. A energia criadora que engendra o Universo manifesta-se no homem, que não está separado nem é diferente dela. O nome dessa energia é kundaliní. A nossa consciência individual é apenas uma das suas dimensões, pois energia e consciência não são coisas separadas. A ciência concorda com o Yoga em que o universo é um verdadeiro mar de energia. Eles diferem, entretanto, quanto ao significado dessa constatação. O Yoga diz que ela possui implicações pessoais profundas. Se a matéria é de fato vibração, então o corpo humano, que faz parte do mundo material, também está feito de energia. Consciência e energia estão intimamente ligadas, sendo dois aspectos da mesma realidade.
O corpo humano não é apenas matéria inconsciente ou uma carcaça habitada por uma alma etérea, mas uma realidade vibratória animada pela mesma consciência que anima a própria mente. Por isso, deveríamos deixar de vê-lo como algo diferente do nosso ser "invisível". Pense no seu corpo como um receptáculo de energia cósmica, um aglomerado de átomos conscientes, construído à imagem do macrocosmos. A consciência vibra em cada uma das suas células, o prána está presente em todos seus tecidos. Quando corpo e mente se unem, a consciência do corpo sutil começa a revelar-se.
O Yoga afirma: você é a própria existência. Toda divisão do tipo corpo-mente, carne-espírito etc. é pura especulação. A diversidade aparece dentro da Unidade, sem separar-se dela. A existência é uma continuidade que se estende desde o princípio da Consciência (Purusha) até o aspecto mais denso da matéria. O microcosmos reflete o macrocosmos: o infinitamente grande é igual ao infinitamente pequeno. É sabido que o homem utiliza menos de dez por cento da capacidade do seu cérebro. O Yoga é um caminho para desenvolver os outros noventa por cento e penetrar em dimensões desconhecidas do nosso ser.
Kundaliní é a detentora da força, o suporte e o poder que move não apenas o indivíduo, mas também o Universo. Macrocosmicamente, ela é Shaktí, Prakriti, a manifestação do poder de Shiva. Na escala humana é a energia, o motor, a causa do movimento e da vida do indivíduo. O despertar dessa força conduz à iluminação. A kundaliní representa-se no homem como uma serpente adormecida, enrolada três vezes e meia em torno do shivalingam (o falo, símbolo do poder gerador masculino), obstruindo com a sua cabeça a entrada da sushumná nádí, o canal mais importante dos que veiculam os alentos vitais, situada na base da coluna vertebral, no chacra chamado múládhára.
O despertar da kundaliní produz um calor muito intenso. A sua ascensão através dos chacras, num processo sistemático e gradual, desenvolve poderes latentes. O processo consta de duas etapas: na primeira, o yogin procederá à saturação prânica do organismo através dos exercícios, a segunda é o despertar em si. A técnica consiste em concentrar o prána em idá e pingalá nádí, levando essa energia para o múládhára chacra. O iogue faz com que o prána chegue até onde reside a kundaliní, cessando esta então de circular pelas duas nádís e concentrando-se na entrada da sushumná, que está bloqueada pelo primeiro nó, o brahmagranthi.
Transposto este obstáculo, acontece o despertar e desenvolvem-se os fenômenos subsequentes: ascensão pela sushumná nádí, penetração e ativação dos centros de força e samádhi, que acontece quando a serpente chega ao sétimo chacra, chamado sahásrara, no alto da cabeça: "Um clarão intensamente abrasador brota no corpo. Kundaliní adormecida, aquecida por esse abrasamento, desperta. Tal como uma serpente tocada por uma vara, ela levanta-se sibilando; como se entrasse em sua toca, introduz-se na brahmanádí (sushumná)." Hatha Yoga Pradípika, III:67-6.
Os chacras são os centros de captação, armazenamento e distribuição de energia no corpo. Literalmente, chacra significa roda, disco ou círculo. Também recebem o nome de padmas ou lótus. Existem milhares de centros de força distribuídos pelo corpo todo, porém, para efeito da prática, nos ocuparemos apenas dos sete principais, que se encontram ao longo da coluna vertebral e na cabeça. Eles são: múládhára, swádhisthána, manipura, anáhata, vishuddha, ájña e sahásrara chacra. Estão unidos entre si pelas nádís, os canais de circulação da energia, como se fossem pérolas de um colar.
A aparência desses chacras é circular, brilhante, como pequenos CDs, de quatro ou cinco dedos de largura, que giram vertiginosamente. O elemento que corresponde a cada chacra determina a sua cor. Cada um tem um bíja mantra, isto é, um som semente, ao qual responde quando é devidamente estimulado. Representam-se com um número definido de pétalas, sobre as quais aparecem inscritos fonemas do alfabeto sânscrito, os bíjas menores, que simbolizam as manifestações sonoras do tipo de energia de cada chacra. Dessa forma, cada fonema estimula uma pétala definida de um chacra. Esse é o motivo pelo qual o sânscrito é considerado língua sagrada: o seu potencial vibratório produz efeitos em todos os níveis.
Cada chacra tem igualmente uma deidade e uma shaktí, com diferentes nomes, atributos, emblemas etc. Isto não significa que no corpo sutil existam pequenas imagens de deusas e deuses cheios de braços e cabeças, e armados até os dentes, assim como não há neles diagramas geométricos ou animais imaginários. São símbolos das propensões e latências samskáricas associadas a cada centro. Esses símbolos falam diretamente à mente subconsciente. Não precisam ser "interpretados". A única coisa a fazer é observar-se frente a eles, e às emoções que despertam.
Quando você visualiza, por exemplo, uma shaktí carregando uma caveira cheia de sangue ou uma espada na mão, deve prestar atenção à reação que essa imagem provoca na sua consciência. Isso tem por objetivo detectar seus condicionamentos, para poder trabalhar sobre eles. Preste muita atenção a esses detalhes. Observe-se atentamente o tempo todo, porém, com mais cuidado ainda enquanto acompanha a construção mental dessa parte dos chacras. Compare essas vivências e seus resultados, e veja como elas mudam de chacra para chacra. Se em algum momento você percebe que um símbolo destes provoca uma reação como medo ou surpresa em você... atenção! Pode ser sinal de que poderá ter uma revelação sobre si próprio nos próximos minutos. Observe-se. Observe-se o tempo todo.
Entretanto, a experiência com essas imagens só pode ser aproveitada devidamente quando o praticante consegue um bom grau de auto-observação. Se você for iniciante, pule a descrição das deidades e trabalhe apenas sobre os símbolos geométricos e as cores dos tattwas, que já são por si só muito poderosos. Existe uma analogia entre os chacras e os diversos plexos do corpo físico, mas é um erro querer identificá-los com as partes da anatomia humana.
Ao meditar nos chacras, você não deve prestar atenção ao corpo físico, mas ao corpo sutil, no espaço interior. Pense nos chacras como redemoinhos com o centro mais claro que as extremidades, girando vertiginosamente em ambos os sentidos. Você poderá perguntar: "em ambos os sentidos? Como assim?" Assim mesmo. Os chacras giram em ambos os sentidos. E giram muito rapidamente.
O processo respiratório não é apenas inspirar ou apena expirar. Os chacras não giram só para a direita ou só para a esquerda. O universo é expansão e recolhimento, em todos os planos. Quando se medita sobre um chacra, uma das coisas que se precisa fazer é ver qual é o movimento dominante nele, se horário ou anti-horário. O movimento horário faz com que o chacra projete energia para fora. O anti-horário é para captar energia do ambiente. Isto é fácil de se conseguir com um pouquinho de prática, usando a intuição. Raramente falha.
Como acabar definitivamente com a dúvida sobre o sentido do giro? Yata Brahmande tata pindade: assim como é no Universo, assim também é no ser. O mesmo exemplo que se usa na física para explicar o fluxo dos campos magnéticos, se aplica perfeitamente ao movimento dos chacras.
Faça assim: feche o punho da sua mão direita e deixe o polegar para cima. Com uma caneta, desenhe uma flecha na gema do polegar e uma flecha nos lados visíveis dos dedos indicador e mínimo, com as pontas voltadas em direção às unhas.
Lembre que a energia sempre circula desde o punho para as pontas dos dedos. O polegar simboliza a energia que entra ou sai do chacra. Vamos checar, por exemplo, em que sentido está girando neste momento seu swadisthána chacra. Feche os olhos e concentre-se no chacra.
Observe-o, respirando profundamente durante alguns instantes. Concentre-se no sentido do giro. Se o chacra estiver girando em sentido horário (ou seja, se estiver girando no mesmo sentido que os ponteiros do relógio, quando você olha de frente para ele), você apoia o punho com o lado do dedo mínimo voltado para o seu ventre.
O giro do chacra coincide com o sentido da seta que você desenhou no dedo mínino. Aí você repara que a energia está saindo, conforme indica a seta do seu dedo polegar. Se for ao contrário, se o seu chacra estiver captando energia do ambiente, ele tenderá a girar em sentido anti-horário. Nesse caso, observe a seta desenhada no seu dedo indicador e volte o polegar em direção ao seu ventre. Isso vai lhe dar a pauta do movimento predominante. Mas não esqueça que eles giram em ambos os sentidos.
Faça o seguinte experimento: encha um aquário com água limpa. Prepare separadamente dois copos de água tingida com anilina da mesma cor: um deve ser de cor bem intensa, enquanto o outro deve ter uma cor mais clara. Jogue ambos os líquidos coloridos ao mesmo tempo no aquário e observe. O que você vê? Quando as águas se misturam, dá a nítida sensação de que a cor mais forte está "entrando" na cor mais clara. Mas, em verdade, o que acontece é que as partículas de água mais clara também estão "entrando" na água mais escura. Da mesma forma, quando você vê um chacra girando, apenas percebe o movimento aparente dele, aquele que prevalece. Os chacras sempre giram em ambos os sentidos, mas sempre predomina um.
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Pedro Kupfer é professor de Yoga, mora em Mariscal - SC e é editor do site http://www.yoga.pro.br/inicial.php.
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